Opinião Orlando Silva – O Dólar como moeda chave no comércio internacional
Orlando Monteiro da Silva*
Muito tem sido falado sobre a substituição do dólar por outras moedas nas transações internacionais. No entanto, pouco se comenta sobre como o dólar chegou lá e se uma substituição é possível.
Tudo começou em 1944, numa cidade dos Estados Unidos, chamada Bretton Woods, que sediou e deu nome à conferência internacional, cujo objetivo foi arrumar o sstema monetário internacional, desarrumado pela grande depressão e pela segunda guerra mundial. Durante aqueles eventos ocorreram grandes desvalorizações das moedas dos países, de controles do comércio e dos pagamentos. Antes desses eventos, prevalecia o padrão ouro, no qual cada governo fixava o preço do ouro em termos da moeda doméstica e, indiretamente, fixava a taxa de câmbio entre as diferentes moedas. A taxa de câmbio única funcionava como uma língua comum, reduzindo os custos de transação e facilitando o comércio internacional. Visando um retorno às condições anteriores, o resultado daquela conferência permitiu uma pequena flexibilidade à taxa de câmbio (+/- 1%) e deu ao dólar o papel primordial de manter a paridade com o ouro (35 dólares por onça), em um novo sistema a ser administrado pelo recém-criado Fundo Monetário Internacional (FMI). Os países membros deveriam informar ao FMI os valores em ouro ou em dólares de suas moedas e intervir nos mercados de ouro ou dólar, para manter as moedas dentro daquele limite de paridade. Desvalorizações das moedas seriam permitidas somente se houvesse alguma mudança fundamental nas economias. Os países manteriam a paridade de suas moedas mantendo reservas em ouro, dólares ou, tomando empréstimos do FMI. Os Estados Unidos tinham acumulado muito ouro após a II Guerra e, em 1949, detinham 75% de todo o estoque oficial. Assim, os demais países declararam ao FMI a paridade das suas moedas em dólares, mantiveram reservas basicamente em dólares e intervinham nos mercados de moeda usando dólares. A possibilidade de receber juros nas aplicações em dólares foi um estímulo adicional. Esse sistema de taxas de câmbio ajustável permaneceu até 1971, quando os Estados Unidos desvalorizaram o dólar em relação ao ouro. Em 1973, uma nova desvalorização e o fim da conversibilidade ao ouro, tornou o sistema de taxas de câmbio totalmente flexível.
A mudança do sistema cambial não mudou o papel do dólar nos mercados internacionais e os bancos centrais continuaram a adicioná-lo em suas reservas. Segundo o FMI, 60% das reservas dos Bancos Centrais são em dólares (outros 20% em EUROS), além de 90% das transações internacionais serem faturadas em dólares. É a moeda da maior economia do mundo, com estabilidade política e econômica, instituições sólidas, onde se observa o estado de direito e o direito de propriedade. Há abertura e integração aos mercados globais e estabilidade da moeda, que mantém as funções de meio de troca e reserva de valor, sendo amplamente aceita e confiável.
Entre as sugestões de substituição do dólar estão o EURO, o Renmimbi (yuan) e as criptomoedas. O Euro ganhou algum status quando do seu lançamento, mas vem encontrando resistências até mesmo entre os países membros. O renmimbi é a moeda de um Estado totalitário, pouco transparente e que interfere nos mercados de capital e crédito. As criptomoedas estão fora dos sistemas regulatórios e a falta de estabilidade inibe sua utilização e manutenção. Transações bilaterais esporádicas continuarão a ser realizadas com essas e outras moedas, mas parece muito improvável que ocorra a substituição do dólar como moeda chave no mercado internacional.
* Professor colaborador/voluntário da UFV. Mestrado em 1979 pela UFV e Doutorado em 1990 pela North Carolina State University. Atua em barreiras não alfandegárias e comércio internacional, demanda e interdependência de mercados, métodos quantitativos em economia e comércio internacional de commodities agrícolas.